domingo, 19 de julho de 2009

O sacerdócio edifica a Igreja - Homilia

Ao proclamar o Ano Sacerdotal, com ocasião da comemoração do 150º aniversário do dies natalis de São João Batista Maria Vianney o Santo Padre, Papa Bento XVI, disse que pretendia “contribuir para fomentar o empenho de renovação interior de todos os sacerdotes para um testemunho evangélico mais vigoroso e incisivo”. Este Ano Sacerdotal deve ser um tempo no qual não só os sacerdotes, mas todos os fiéis redescubramos a beleza deste grande dom que o Senhor confiou à Sua Esposa, a Igreja.
Se todo cristão é um «Outro Cristo» - Alter Christus -, com muito mais razão o é o sacerdote. Homem configurado ao Senhor não só em virtude do sacramento batismal, mas também pela ordenação sacerdotal, que realiza nele uma identificação total com Cristo, Cabeça da Igreja. Podemos dizer que tal identificação é tão profunda, que já não existe uma alteridade perfeita entre Cristo e o sacerdote. Ele já não é somente um Alter Christus, mas Ipse Christus, o mesmíssimo Cristo.
Estritamente falando, só existe um Único Sacerdote: Jesus Cristo. Todos aqueles que recebemos o dom do sacerdócio por imposição das mãos dos Apóstolos e seus sucessores somos sacerdotes n’Ele, isto é, participamos do seu único e sempiterno sacerdócio.
O sacerdote perpetua a presença do Senhor na história dos homens de todos os tempos. Ele é chamado a fazer de sua voz, a voz de Seu Senhor; do seu olhar, o mesmo olhar amoroso do Mestre; de suas mãos, mãos que seguem curando e levantando aqueles que sofrem sob o peso de seus pecados. Parafraseando a Bem Aventurada Madre Teresa de Calcutá, podemos dizer, em uma palavra, que o sacerdote permite que Cristo siga amando através dele.
Por mais que quiséssemos, jamais conseguiríamos abarcar por completo este mistério na Igreja de Deus. O Santo Cura d’Ars dizia aos seus, que se entendêssemos o que é um sacerdote, morreríamos, não de susto, mas de amor. Afirmava também que só no Céu, o sacerdote entenderá bem a si mesmo.
A dignidade dos sacerdotes - a qual todos somos chamados a redescobrir neste Ano Sacerdotal - não consiste nas qualidades pessoais daqueles que são chamados a este ministério. Na verdade, parece que essas são inclusive bem escassas naqueles a quem o Senhor chama. Se Ele fosse seguir a lógica humana, certamente escolheria a outros. Há seguramente muito mais pessoas eloqüentes por aí, mais inteligentes, e até mesmo mais santas. Por certo, a criatura mais perfeita e bela que saiu das mãos de Deus, a Virgem Maria, não foi chamada ao sacerdócio. Aqui cai por terra a débil argumentação feminista, segundo a qual as mulheres deveriam ser também ordenadas, pois possuem a mesma dignidade que os homens. Em parte é verdade, mulheres e homens possuem a mesma dignidade diante de Deus, mas a dignidade do sacerdote - ignoram os feministas - não reside em que ele humanamente seja mais ou menos digno, mas no tesouro sobrenatural que ele porta, apesar do pobre vaso que é, na eleição que o próprio Deus fez dele.
O Senhor chama aqueles que Ele quis (Cf. Mc 3,13). Essa é a razão suprema do chamado sacerdotal: o querer libérrimo de Deus, totalmente independente das qualidades pessoais daquele que é chamado. A vocação sacerdotal é, por isso, dom totalmente gratuito. Ninguém tem “direito” a recebê-la.
A presença do sacerdote no mundo é absolutamente necessária para que a redenção alcance a todos os homens. A ação mais sublime que um homem pode realizar na terra - consagrar o Corpo e o Sangue do Senhor, e perdoar os pecados - só pode ser realizada por um sacerdote. “O padre possui a chave dos tesouros celestes: é ele que abre a porta; é o ecônomo do bom Deus; o administrador dos seus bens (…). Deixai uma paróquia durante vinte anos sem padre, e lá adorar-se-ão as bestas” (São João Maria Vianney).
Sem padre, não há Eucaristia, e, sem Eucaristia, não há Igreja. O teólogo francês, Henri de Lubac, afirmava que a “Eucaristia edifica a Igreja”. Podemos aqui acudir também a uma paráfrase e dizer que “o sacerdócio edifica a Igreja”. O caminho inverso, infelizmente, também é verdadeiro. Se alguém quiser desedificar a Igreja, tentará fazê-lo procurando destruir o sacerdócio. O demônio e os seus amigos sabem muito bem disso, e, como não tiram férias, tentam a todo o momento macular a imagem dos sacerdotes entre os homens.
Essa é a única razão pela qual os pecados dos ministros de Cristo são lançados aos quatro ventos, para que todos os contemplem e deixem de perceber o tesouro que escondem por detrás de suas fragilidades humanas. Não sejamos ingênuos: qual outra razão teriam em publicar em diversos meios de comunicação as misérias desses homens?
É verdade, lamentavelmente, que existem - sejamos realistas - sacerdotes que profanam o seu celibato com toda a espécie de corrupção sexual que a criatividade dos filhos de Adão pode imaginar, sacerdotes que se vendem por dinheiro, que desobedecem às normas da Igreja, enfim. Como afirmou o Papa Bento XVI, “nada faz a Igreja, Corpo de Cristo, sofrer mais que os pecados dos seus pastores, sobretudo daqueles que se convertem em “ladrões de ovelhas” (João 10, 1ss)”. É um dano inimaginável o que esses maus pastores podem causar às almas de quem eles deveriam salvar, sobretudo porque um sacerdote nunca se condena sozinho. Porém, devemos estar muito vigilantes para que jamais sejamos tomados de certo espírito pessimista, que nos leve a pensar que todos os sacerdotes estão corrompidos, que nos faça, enfim, deixar de contemplar a beleza do ministério sacerdotal, e maravilhosa ação que Deus prodigaliza por meio desses homens.
Diante de tantas sombras, temos que afirmar - também com realismo -, que a imensa maioria dos sacerdotes temos o desejo de sermos fiéis à nossa vocação. Ainda com toda nossa debilidade, que compartilhamos com os nossos irmãos homens, temos o anseio sincero de conversão, de santidade, e para isso, nos confessamos, buscamos uma direção espiritual, e aproveitamos todos os meios ascéticos para colaborar com a graça de Deus em nós. Quantos são os sacerdotes que se consomem diariamente, nos altares de distantes igrejas, no silêncio dos confessionários, nos hospitais, e em tantos outros lugares, para conduzir ao Céu aquelas almas que lhe são confiadas, ocultos aos olhos dos meios de comunicação?
Aproveitemos esta inspirada iniciativa do Santo Padre para fazer novamente brilhar o esplendor do sacerdócio na Igreja Católica. Esplendor que, nem sequer, a miséria dos pastores enfermos - não existem maus pastores, mas pastores doentes - poderão roubar da Santa Igreja. Resgatar práticas simples, mas carregadas de fé, como, por exemplo, pedir a bênção aos sacerdotes. Incentivá-los a que se vistam como padres. Rezar muito pela sua conversão. Fazer, de alguma forma, com que nós mesmos redescubramos o tesouro que recebemos em nossa ordenação e recuperemos nossa identidade diante da Igreja e do mundo.
Certa vez ouvi dizer que a sociedade civil é um reflexo da sociedade eclesiástica. Se isso é verdade, pense no que poderíamos fazer no mundo com um punhado de sacerdotes santos?

Pe. Demétrio Gomes da SilvaDiretor do Instituto Filosófico e Teológico do Seminário São José da Arquidiocese de Niterói.

Outros textos para Ano Sacerdotal: http://www.presbiteros.com.br/index.php/category/ano-sacerdotal/

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Ano Sacerdotal 2009-2010

Em ligação a este ano dedicado ao Sacerdócio, façamos uma breve reflexão em torno deste divino dom a partir do Decreto “A Ordem dos Presbíteros” do Concílio Vaticano II.
Tal decreto nos diz: “os presbíteros, em virtude da sagrada Ordenação e da missão que recebem das mãos dos Bispos, são promovidos ao serviço de Cristo Mestre, Sacerdote e Rei, de cujo ministério participam e mediante o qual a Igreja continuamente é edificada em povo de Deus, Corpo de Cristo e templo do Espírito Santo” (Presbiterorum Ordinis [PO] n. 1).
A Sagrada Ordenação e Missão recebidas – Daqui se pode retirar a natureza, a razão de ser dos sacerdotes. A Ordem diz respeito a um dos Sacramentos instituído por Jesus ao separar, entre os que O seguiam, doze (12), para uma missão especial: assim como o Pai me enviou, Eu vos envio (Jo 20,21). “Cristo, mediante os mesmos apóstolos, tornou participantes da sua consagração e missão os sucessores deles, os bispos, cujo múnus de ministério, em grau subordinado, foi confiado aos sacerdotes, para que constituídos na Ordem do presbiterado fossem cooperadores da Ordem do Episcopado para o desempenho perfeito da missão apostólica confiada por Cristo (PO n. 2).
Promovidos ao serviço de Cristo Mestre, Sacerdote e Rei – Percebemos aqui o “ofício dos presbíteros” do qual participam da autoridade com que o próprio Cristo funda, santifica e governa o seu Corpo, que é a Igreja. Pois, “o sacerdócio dos presbíteros é conferido mediante um sacramento particular, em virtude do qual os presbíteros, pela unção do Espírito Santo, são assinalados com um caráter especial (caractere - marca) e, assim, configurados a Cristo Sacerdote, de tal modo que possam agir na Pessoa de Cristo cabeça” (Ibid.).
Pelo Ministério edificam a Igreja – É mediante o “múnus apostólico”, do qual participam a seu modo, que os presbíteros recebem de Deus a graça de serem ministros de Jesus Cristo no meio dos povos. “Com efeito, o povo de Deus é convocado e reunido em virtude da mensagem apostólica, de tal modo que todos quantos pertencem a este povo, uma vez santificados no Espírito Santo, se ofereçam como ‘hóstia viva, santa, agradável a Deus’ (Rm 12,1)”. Aqui se percebe a essencialidade do sacerdócio ministerial entre o povo de Deus, pois, “é pelo ministério dos presbíteros que o sacrifício espiritual dos fiéis fica consumado em união com o sacrifício de Cristo, mediador único, que é oferecido na Eucaristia de modo incruento e sacramentalmente pelas mãos deles, em nome de toda Igreja, até quando o mesmo Senhor vier” (Ibid.).
Em conclusão, os presbíteros, com seu ministério e com sua vida têm por fim atingir “a glória de Deus Pai em Cristo”. Mas, “quer orem ou adorem, quer preguem a palavra de Deus, quer ofereçam o Sacrifício Eucarístico da Santa Missa ou administrem os demais Sacramentos, quer exerçam outros ministérios a favor dos homens, concorrem, pois, não só para aumentar a glória Deus, mas também para fazer progredir os homens na vida divina” (Ibid.).